A importância de se formar bons auditores da qualidade
Por: Prof. Oceano Zacharias
Auditar conforme a norma ISO 9001 requer, dos auditores, obter um bom entendimento do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) das empresas e da natureza do seu negócio. Isto explica porque é benéfico para a organização ser visitada antes da sua auditoria de certificação, para ser conduzido o primeiro estágio da auditoria. Este primeiro estágio (pré-auditoria) é feito, inicialmente, para planejar a auditoria de certificação (o segundo estágio), bem como permitir que o auditor obtenha um entendimento da organização.
Por exemplo: adquirir conhecimento sobre o SGQ, políticas, objetivos, riscos, processos, instalações, etc. Também pode ser usado para que o organismo auditor comunique suas necessidades e expectativas à organização a ser auditada.
As atividades realizadas, preliminarmente, no primeiro estágio da auditoria, incluem:
– A identificação dos riscos chaves do negócio, aspectos regulamentadores e estatutários relacionados e conformidade.
– Avaliação dos processos definidos pela organização, e se estes estão sendo adequados para satisfazer os seus objetivos e os requisitos do cliente.
– Conduzir uma análise crítica da documentação. Esta análise crítica pode determinar se a documentação do SGQ da organização cobre, adequadamente, todos os requisitos da norma. A análise crítica, normalmente, pode ser conduzida nas instalações da organização (a menos que solicitado e justificado de outra maneira). Como resultado desta atividade, um relatório deve ser providenciado no qual constam as áreas deficitárias. Como parte da documentação de análise crítica, o auditor deve avaliar a extensão e disponibilidade dos procedimentos de apoio e descrição dos processos.
– Coletar informações necessárias a respeito do escopo do sistema de gestão da organização, processos e instalações.
– Esboçar a documentação futura da certificação, incluindo a declaração do escopo.
– Planejar a auditoria de certificação (2º estágio), incluindo os requisitos para a seleção da equipe auditora.
– Obter evidências de que auditorias internas e a análise crítica da Alta Direção estão sendo planejadas ou realizadas de forma eficaz.
– Checar se o SGQ está implementado e pronto para o segundo estágio da auditoria, incluindo nível apropriado da documentação e os registros de apoio. Se o sistema está falho em algum ponto, o auditor pode mencionar no relatório de auditoria, de modo que a organização tenha uma oportunidade de retificar suas deficiências antes da sua auditoria de certificação (2º estágio).
Dessa forma, a formação de um auditor da qualidade passa, necessariamente, pelo conhecimento de algumas técnicas para auditar ou até mesmo ser auditado. Em primeiro lugar, vamos diferenciar os tipos de auditorias:
Interna – Mais do que atender a requisito normativo, a Auditoria Interna tem por objetivo verificar se as atividades da qualidade estão, na prática, em conformidade com o que foi planejado e está descrito nos procedimentos, e para determinar a eficácia e a melhoria do Sistema de Gestão da Qualidade. A denominação “interna” significa “por opção interna” e nada tem a ver se realizada com funcionários da organização ou por profissionais contratados para tal.
Externa de 2ª parte – Tem por objetivo avaliar se os fornecedores são capazes de atender os requisitos acordados antes e durante o processo de fornecimento. Esta auditoria ocorre por solicitação do cliente ou potencial cliente, e é realizada por funcionários dele ou por profissionais contratados por ele e que o representam.
Externa de 3ª parte – É uma auditoria realizada por um órgão reconhecidamente independente tanto da empresa auditada quanto dos clientes. A principal finalidade é a evidência de que o Sistema da empresa auditada está em conformidade com a norma selecionada, e as atividades estão padronizadas em concordância aos documentos do Sistema. O exemplo mais comum, em se tratando de Gestão da Qualidade,é o da auditoria de certificação.
De Manutenção – Tem por objetivo avaliar se o Sistema implementado atende aos requisitos do modelo normativo adotado e a política da qualidade estabelecida pela empresa. No caso da certificação, pode ser incluído além da norma aplicável e documentação requerida, itens específicos do contrato com o organismo certificador.
De Acompanhamento de follow-up – É a auditoria realizada para verificar a implementação e eficácia de ações corretivas previamente acordadas em auditoria anterior.
E quais são os objetivos das auditorias? Verificar se as regras estabelecidas estão aplicadas e se estas regras são pertinentes quando comparados aos objetivos planejados. Ao final de cada auditoria deve ser julgada e avaliada a coerência dos objetivos dos diferentes processos em relação aos objetivos da empresa. Por esta razão é recomendável concluir as auditorias através de uma reunião de Análise Crítica pela Administração. O escopo de auditoria pode ser do tipo completa, em que abrange todas as funções e atividades pertinentes à Gestão da Qualidade; e parcial quando se limita a determinada função, área, linha de produto ou atividade de interesse. As auditorias podem ser classificadas como:
De Adequação – Envolve a avaliação da adequação de programas da qualidade através de análise da documentação visando evidenciar a existência de políticas, programas e procedimentos da qualidade, que, se forem seguidos, garantirão o cumprimento de obrigações contratuais, legais ou normativos.
De Conformidade – Envolvem a medição de conformidade por setor (função/atividade), com relação a programas, sistemas, procedimentos e especificações, através da análise da documentação e de sua efetividade nos locais de uso. Os programas, sistemas e procedimentos foram implementados e estão sendo cumpridos pelo setor? Os objetivos estão sendo alcançados? As não-conformidades são tratadas? Como? As descrições de cargos são cumpridas?
De Processo – Verificação do cumprimento de instruções e procedimentos operacionais. São mais utilizadas em processos de produção e de inspeção.
De Produto – Verificação da conformidade do produto com as suas especificações, avaliando a eficácia dos controles estabelecidos. Pode ser usada em vários estágios da produção, sendo mais comum para produto final.
E quando efetuar uma auditoria? Um Sistema da Qualidade um programa de atividades introduzido pela direção, seja por iniciativa própria ou como resultado da pressão dos seus clientes. Em qualquer destes casos, a alta administração deverá ter à disposição um mecanismo para determinar a efetividade do seu sistema atual e identificar áreas que necessitem ações corretivas ou melhorias. Este mecanismo é a auditoria.
As auditorias devem ser planejadas e implementadas de forma a assegurar a abrangência de todos os elementos das diretrizes de garantia da qualidade fixadas. Abrange uma reunião inicial, a aplicação da auditoria e uma reunião de fechamento, expondo uma descrição sucinta do resultado da auditoria, com indicação das conclusões, com ênfase para as deficiências detectadas.
A preparação da auditoria deverá incluir as seguintes etapas:
Nomeação do auditor-líder – Os responsáveis pela gestão do programa de auditorias deverão selecionar o auditor-líder, coordenador da equipe auditora.
Definição de objetivos, campo de aplicação e critérios de auditoria:
– O auditado/cliente deverá definir os objetivos da auditoria;
– O âmbito e os critérios deverão ser definidos entre o cliente e o auditor-líder;
– Quaisquer alterações posteriores terão de ser acordadas entre os mesmos;
Os objetivos da auditoria definem o que se espera que seja verificado durante a mesma, e poderão incluir:
– determinação do grau de conformidade do sistema de qualidade ou de parte dele, com os critérios definidos;
– avaliação da capacidade do sistema para garantir o cumprimento com os requisitos legais ou contratuais;
– avaliação da capacidade do sistema para atingir os objetivos específicos;
– identificar potenciais áreas de melhoria.
Os responsáveis pela gestão do programa de auditorias deverão determinar se a auditoria é exeqüível, baseando-se nos seguintes critérios:
– existência de informação suficiente e adequada para o seu planejamento;
– adequada cooperação do auditado;
– disponibilidade de tempo e recursos.
– sempre que não seja exeqüível, há que combinar uma alternativa em conjunto com o auditado;
– se a auditoria é exeqüível, passa-se então à escolha da equipa auditora, tendo em conta as competências necessárias em função dos objetivos;
– se só existir um auditor, ele terá de assumir todas as tarefas do líder;
– os responsáveis pelo programa de auditorias, ou o líder, deverão identificar em conjunto com o cliente (ou o auditado) todos os recursos necessários;
– Seleção da equipe auditora. Com o intuito de se poder decidir o tamanho e composição da equipa auditora, deve ser tido em consideração:
– objetivo, âmbito, critérios e duração;
– competências da equipa versus objetivo;
– requisitos de organismos de acreditação ou certificação, se aplicável;
– assegurar a independência de toda a equipa em relação às atividades a auditar para evitar conflito de interesses;
– no caso de os conhecimentos dos auditores não serem suficientes, deverão ser incluídos especialistas técnicos, que irão trabalhar sob a orientação dos auditores;
– O auditado ou o cliente da auditoria podem solicitar a substituição de determinados membros da equipe auditora, desde que o possam fundamentar com base nos Princípios das Auditorias (exemplos de situações: um auditor que já foi colaborador da organização a auditar, um auditor que prestou serviços de consultoria na organização a auditar, comportamento não-ético do auditor);
– Antes da auditoria nas instalações deve ser feita uma revisão documental, para determinar a conformidade do sistema (tal como documentado) com os critérios;
– A revisão deve incidir sobre a documentação do sistema, registros, e até mesmo, relatórios de auditorias anteriores;
– Caso a documentação não esteja adequada, a equipa deve comunicar logo ao auditado/cliente e a auditoria pode ser adiada até resolução.
– Preparação para a auditoria às instalações
– A equipe terá de preparar um Plano da Auditoria, que serve para si e para o auditado, para facilitar o a coordenação e o acompanhamento das atividades por todos os envolvidos.
Plano da Auditoria
O plano deve ser suficientemente flexível para permitir alterações, devendo considerar os seguintes elementos:
– Objetivos;
– Critérios/documentos de referência; Âmbito (unidades a auditar);
– Datas e locais;
– Horário e duração da auditoria em cada local ou em cada atividade, incluindo as reuniões com a direção do auditado e as reuniões internas da equipa auditora;
– Funções e responsabilidades dos auditores e dos acompanhantes;
– Indicação do representante do auditado (responsável pela área auditada);
– Idioma a utilizar na auditoria e no relatório;
– Questões relativas ao relatório a fornecer (classificação de não-conformidades), tal como formato, lista de distribuição e data de emissão e entrega;
– Aspectos logísticos (viagem, alojamento);
– Questões ligadas à confidencialidade. O plano deve ser verificado e aceito pelo auditado, antes de a auditoria começar. Quaisquer objeções por parte do auditado devem ser colocadas ao auditor-líder, acordadas novamente e resolvidas antes do início da auditoria. Caso haja lugar a uma alteração ao plano, a sua nova versão tem de ser reenviada a todas as partes interessadas, antes da auditoria. Os documentos de trabalho (listas de verificação, impressos para registro de constatações e relatório, impresso para registro das presenças nas reuniões) deverão ser preparados antecipadamente, por forma a serem usados por todos os elementos da equipe. As listas de verificação não deverão restringir a equipe, podendo ser modificadas ao longo da auditoria.
Dicas para uma boa auditoria
Quando se vai auditar um sistema, deve-se procurar as evidências observando o processo, analisando seus documentos e examinando seus registros. Todavia, uma importante fonte de evidências reside nas informações levantadas nas entrevistas.
Razões da entrevista:
– Ela suplementa o processo documentado;
– Determina o processo realmente definido;
– É uma maneira importante de obter informações;
– Permite ao auditado explicar as práticas de trabalho;
– Estabelece a compreensão; o compromisso.
Etapas da entrevista:
– Entreviste a pessoa em seu posto de trabalho;
– Faça a entrevista dentro do horário normal do expediente;
– Deixe a pessoa se sentir à vontade (baixo nível de ansiedade);
– Explique seu objetivo (aquilo que você quer);
– Pergunte-lhe sobre seu trabalho (pergunte; observe);
– Verifique as respostas (confirme a compreensão);
– Verifique os fatos (use outras fontes);
– Registre as evidências (anotações em check-list);
– Faça uma tentativa de conclusão (sem segredos);
– Dê oportunidade de outros tópicos serem abordados;
– Agradeça pelo tempo e colaboração do entrevistado.
Perguntas fechadas:
– Respostas tipo sim / não;
– Use-as com parcimônia para estabelecer fatos específicos;
– “Você mantém um registro dessa operação?”
Perguntas abertas:
– O que, por que, onde, quando, quem e como;
– Estimula respostas mais completas; “Que registros existem para essa operação?”
– Perguntas do tipo “Mostre para mim”:
– Peça para ver documentos e registros;
– Você precisa das provas de conformidade;
– Evite uma possível imagem de descrédito;
– “Eu poderia ver os registros dessa operação?”
Técnicas de fazer perguntas:
– Pergunte e depois escute atentamente;
– Dependa primordialmente de perguntas abertas;
– Evite perguntas fechadas (exceto para confirmar);
– Peça explicações e exemplos; Refaça suas frases para esclarecer;
– Reafirme a resposta, para sua compreensão;
– Mantenha-se neutro; não discorde nem interrompa;
– Faça perguntas tipo “suponhamos que”, ou “e se…” ;
– Procure falhas básicas com perguntas simples;
– Faça uma pergunta direta sobre qualidade;
– Concorde para manter o diálogo;
– Use o silêncio para respostas expandidas;
– Observe expressões faciais;
– Aprenda com observações de pessoas próximas.
– Anotações durante a entrevista:
– Faça anotações breves (o que foi visto e ouvido);
– Explique por que você está fazendo anotações;
– Lance os fatos (referências específicas);
– Identifique nomes e cargos (nas anotações);
– Registre afirmações-chave como evidências;
– Localize respostas diferentes para follow-up;
– Determine as atividades para análise futura.
Dicas para a entrevista:
– Fale primeiro com o gerente da área (cortesia);
– Peça permissão para entrevistar os funcionários;
– Inclua funcionários de meio-período e temporários;
– Confirme a compreensão para evitar erros;
– Não se desvie do assunto por preocupações menores;
– Não espere por dados; continue a auditoria;
– Seja sempre cortês e respeitoso.
Fontes de evidência:
– Documentos (normas, planos, procedimentos, instruções, contratos);
– Declarações (entrevistas, comentários informados);
– Observações (ambiente de trabalho, atividades, percepções visuais);
– Registros (testes, relatórios, minutas, formulários, dados de desempenho).
Quem deve auditar?
A auditoria deve ser sempre realizada por profissionais altamente capacitados, especializados e experientes. Até a antiguíssima versão ’94 da ISO 9000 era pertinente fazer a auditoria interna por profissionais da própria empresa mediamente capacitados em auditar; isto porque o lema era “escreva tudo que você faz, faça tudo que você escreveu”, e assim a auditoria era meramente comparativa entre o que estava escrito e o que se fazia. A partir da versão 2000, esta determinação, procedimentar tudo, deixou de existir, passando o foco do sistema da qualidade do produto para o sistema da gestão da qualidade dos processos. Esta condição impõe que as auditorias internas sejam realizadas de forma altamente profissional – isto é, por auditores mesmo. É o caso de organizações de grande porte que têm auditores internos full-time; são profissionais cujo cargo é Auditor – no crachá – ligados à Diretoria da Qualidade, e não como certas empresas que utilizam funcionários de diversas áreas para, de quando em quando, fazerem uma auditoria. Com dissemos acima, isto era adequado na versão ’94, agora isto não faz mais sentido.
ISO 9001:2008
E o que diz a norma ISO 9001:2008 no item 8.2.2 Auditoria Interna?
A organização deve executar auditorias internas a intervalos planejados para determinar se o sistema de gestão da qualidade a) está conforme com as disposições planejadas (ver 7.1), com os requisitos desta Norma e com os requisitos do sistema de gestão da qualidade estabelecidos pela organização, e b) está mantido e implementado eficazmente. Um programa de auditoria deve ser planejado, levando em consideração a situação e a importância dos processos e áreas a serem auditadas, bem como os resultados de auditorias anteriores. Os critérios da auditoria, escopo, freqüência e métodos devem ser definidos. A seleção dos auditores e a execução das auditorias devem assegurar objetividade e imparcialidade do processo de auditoria. Os auditores não devem auditar o seu próprio trabalho. Um procedimento documentado deve ser estabelecido para definir as responsabilidades e os requisitos para planejamento e execução de auditorias, estabelecimento de registros e relato de resultados. Registros das auditorias e seus resultados devem ser mantidos (ver 4.2.4). A administração responsável pela área que está sendo auditada deve assegurar que quaisquer correções e ações corretivas necessárias sejam executadas, em tempo hábil, para eliminar não-conformidades detectadas e suas causas. As atividades de acompanhamento devem incluir a verificação das ações executadas e o relato dos resultados de verificação (ver 8.5.2). NOTA: Ver ABNT NBR ISO 19011 para orientação.
Por fim, lembre-se dos sete amigos do auditor: 5W 1H 1S: O que? (What); Quando? (When); Onde? (Where); Quem? (Who); Por que? (Why); Como? (How); e Mostre-me (Show me) a evidência objetiva. Esta seqüência pode auxiliar na obtenção de respostas quando o auditado estiver utilizando respostas do tipo sim ou não.
Revista Banas Qualidade – Páginas 54 à 59 – Edição 199 – Dezembro 2008
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